NÃO
Ubirajara Godoy Bueno
Quando a mãe lhe disse: não — conteve o choro e amuou-se num canto da sala. Chorar expunha-a ao sério risco de umas palmadas ou castigo mais severo.
A injusta proibição deixava-a mais triste do que não ir ao parque com as amigas. Afinal, era boa aluna, não faltava às aulas e cumpria com os deveres de casa. Comportava-se na presença de visitas e raramente proferia palavrões. Não deixava restos de comida no prato, ainda que fosse torta de abobrinha ou sopa de legumes; exceção, apenas, para quiabo e jiló. Mas a mãe, sempre a dizer não, raramente reconhecia seus méritos. Podava-lhe, sem os devidos motivos, as traquinagens, brincadeiras e passeios. A propósito, também não fora com as amigas apanhar girinos no córrego da escola, tampouco brincar de boneca na casa da vizinha.
Sucedeu ficar doente e durante uma semana arder em febre. O médico recomendou repouso e receitou remédios amargos de cheiro forte, contudo, preferível às injeções. Garantiu o doutor não ser coisa grave, mas quando uma crise mais forte estremeceu-lhe o corpinho frágil, a mãe, à sua cabeceira, suplicou de mãos postas:
— Não morra minha filhinha, não morra.
“Não morra..., não morra ...” — novamente a mãe a lhe dizer não. Incomodava-lhe essa palavra muito mais que a própria enfermidade. Desta feita, não seria obediente. Fechou os olhos e morreu com um sorriso maroto.
* * *
DATA DA PRODUÇÃO: Agosto – 2001 — REGISTRO: Fundação Biblioteca Nacional -Escritório de Direitos Autorais No 474.325 - Livro 894 - Folha 134 - Data: 06/10/2009
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